Discurso Director Regional Dr. Luís Gomes Sambo, por ocasião da 62.ª Sessão do Comité Comité Regional Africano da OMS

Submetido por dinara a Ter, 2017-07-25 21:25
  • Sua Excelência o Senhor Vice-Presidente da República de Angola, Engº Manuel Domingos Vicente;
  • Sua Excelência Senhor Ministro da Saúde da República de Angola;
  • Sua Excelência Senhor Secretário de Estado das Relações Exteriores;
  • Sua Excelência Senhora Vice Governadora da Província de Luanda;
  • Excelências Senhoras e Senhores Deputados à Assembleia Nacional;
  • Suas Excelências Senhoras e Senhores membros do Governo da República de Angola;
  • Senhoras e Senhores Ministros da Saúde dos Estados-Membros da Região Africana da OMS;
  • Suas Excelências Senhoras e Senhores Embaixadores, Chefes das Missões Diplomáticas e chefes das agências multilaterais e bilaterais acreditadas em Angola;
  • Estimado Amigo e Mentor Sr. Agostinho André Mendes de Carvalho “Uanhenga Xitu”, ex-Ministro da Saúde;
  • Distintos convidados,
  • Caros colegas e amigos,
  • Membros da Comunicação Social,
  • Minhas senhoras e meus senhores,

É com grande emoção e enorme sentimento de orgulho que me dirijo a esta augusta assembleia, por ocasião da cerimónia de abertura da 62.ª sessão do Comité Regional Africano da OMS, aqui em Luanda, na República de Angola. Sentimento de orgulho pois pese embora o facto de ter recentemente saído de uma situação de guerra com consequências trágicas, Angola assumiu o desafio de organizar a presente sessão do Comité Regional e mobilizou meios importantes para o efeito. A hospitalidade reservada às delegações dos Estados-Membros e aos representantes dos muitos parceiros que nos honram com a sua presença, comprova indubitavelmente a nossa fraternidade e consideração mútua. 

A emoção que sinto advém do facto de os Angolanos terem reencontrado a paz, o que nos permite que hoje em dia o país inteiro seja um autêntico projecto de desenvolvimento, cujos resultados são tangíveis do ponto de vista económico, social e cultural.

  • Sua Excelência Senhor Vice-Presidente da República
  • Sua Excelências Senhoras e Senhores Ministros
  • Minhas senhoras e meus senhores:

Em nome da Dr.ª Margaret Chan, Directora-Geral da Organização Mundial da Saúde, cumprimento os Ministros da Saúde e os Chefes das Delegações dos Estados-Membros da OMS. Saúdo igualmente os Representantes dos diferentes parceiros do desenvolvimento sanitário em África e dirijo-me também à Coordenadora Residente e aos Chefes das Agências do sistema das Nações Unidas em Angola, e naturalmente os meus colegas funcionários da OMS, para vos desejar a todos as boas-vindas a este evento.

Que me seja permitido expressar, desta tribuna, a minha profunda gratidão ao Presidente da República, Sua Excelência o Engº. José Eduardo dos Santos, ao governo e ao povo angolano pelas condições criadas para a realização da 62.ª sessão do Comité Regional e pelo excelente apoio que têm concedido ao trabalho da OMS na Região Africana.

A ordem do dia da 62.ª sessão do Comité Regional inclui questões prioritárias de saúde pública para a Região Africana. Dos diversos tópicos, destaca-se, em primeiro lugar, a temática do reforço dos sistemas de saúde, em que iremos analisar a forma como as iniciativas mundiais de saúde poderão contribuir para melhorar a prestação de cuidados de saúde integrados às populações; as oportunidades que as novas tecnologias de informação e comunicação oferecem para melhorar os sistemas de informação sanitária; o financiamento e a coordenação da investigação e desenvolvimento para a inovação em saúde; e ainda o roteiro para reforçar os recursos humanos para a saúde, com vista a acelerar os progressos para a consecução dos objectivos nacionais e internacionais de saúde.

Este Comité Regional deverá debruçar-se também sobre as questões ligadas à luta contra as doenças, nomeadamente: a actualização da estratégia de luta contra o VIH/SIDA, a luta contra as doenças crónicas e a promoção da saúde.

Iremos igualmente abordar questões institucionais da OMS, designadamente a reforma em curso, a execução do Orçamento-Programa para 2012-2013, a proposta de Orçamento-Programa para 2014-2015, e as prioridades do 12.º Programa Geral de Trabalho da OMS 2014-2019. 

Suas Excelências Senhoras e Senhores Ministros e Chefes das Delegações, vós tereis ainda a oportunidade de tomar parte em sessões de trabalho com importantes parceiros a respeito de temas essenciais, tais como a década da vacinação e a luta contra o paludismo. Este ano, a medicina tradicional será discutida em painel, que será animado por peritos convidados especialmente para o efeito.

  • Sua Excelência Senhor Vice-Presidente da República,
  • Sua Excelências Senhoras e Senhores Ministros,
  • Distintos convidados,

Esta é de facto a segunda vez que Angola acolhe o Comité Regional Africano da OMS; a primeira vez ocorreu em 1956, antes da independência nacional, numa realidade completamente diferente para África e para a OMS.

Fazendo referência aos arquivos da 6.ª sessão do Comité Regional da OMS, realizada em 1956, em Luanda, constatei o relevo de determinados assuntos, tais como a saúde materno-infantil, as questões do ambiente e saúde, a luta contra a schistosomíase, a oncocercose, a lepra,  a febre-amarela, a varíola e o paludismo. A maioria destes problemas evoluíram de forma favorável, tendo mesmo, em certos casos, sido controlados ou erradicados. Cito como exemplos a erradicação da varíola, o controlo da febre-amarela, o controlo da oncocercose e a melhoria da saúde materna e infantil. 

As reformas dos sistemas de saúde que se seguiram às independências dos países africanos trouxeram melhores oportunidades para o desenvolvimento do sector. É inquestionável que os países da Região Africana registaram progressos no domínio da saúde ao longo destas últimas décadas. 

Estes progressos resultaram da implementação de políticas de saúde mais equitativas, assentes nos cuidados de saúde de base, posteriormente denominados cuidados de saúde primários. A abordagem dos cuidados de saúde primários na Conferência de Alma Ata, de 1978, constituiu uma autêntica revolução da saúde pública. Esta abordagem permitiu uma maior participação comunitária na organização dos cuidados de saúde, a formação e colocação de profissionais de saúde e a melhoria do acesso às tecnologias da saúde, incluindo a disponibilização de medicamentos essenciais e vacinas.

A despeito destes progressos, a tuberculose, o paludismo, algumas epidemias recorrentes e a mortalidade materna e infantil continuaram a ser preocupantes e entretanto no início dos anos 80, surgiu a infecção pelo VIH/SIDA.

A Declaração do Milénio das Nações Unidas de 2000 trouxe uma nova oportunidade de reformas e definiu um quadro de referência que coloca a saúde num lugar central nos ideais e objectivos do Desenvolvimento Humano.

Se compararmos os principais indicadores de saúde à escala mundial, é impressionante a disparidade existente de país para país, no seio dos países e entre subgrupos populacionais como, por exemplo, entre ricos e pobres e; entre zonas urbanas e rurais. 

Segundo as últimas estatísticas da OMS, a esperança média de vida à nascença no mundo é de 68 anos, variando entre 54 anos na Região Africana e 76 anos na Região das Américas, a título de exemplo. A Região Africana, com cerca de  de 12% da população mundial registou 18,6% dos óbitos ocorridos em 2008. 

Em relação à luta contra as doenças em África,  começo por dizer que as doenças transmissíveis representam 63% do total de óbitos na Região Africana. O VIH/SIDA, as doenças diarreicas, o paludismo, a tuberculose e as doenças da infância provocam 88% destes óbitos. Só o VIH/SIDA é responsável por 15,6% do total de óbitos na Região. Apesar destes factos a Região Africana registou progressos no domínio da luta contra o VIH/SIDA. A cobertura das intervenções para redução da transmissão vertical aumentou; a cobertura de tratamento com anti-retrovirais também aumentou, de 100 000 pessoas em 2003 para 6,2 milhões de pessoas em 2011. Contudo, a incidência anual da infecção pelo VIH ainda é muito elevada – 1,7 milhões de novos casos em 2011. Em relação ao paludismo, 12 países da Região africana registaram uma redução da morbilidade e mortalidade na ordem dos 50%. A luta contra o paludismo em África tem boas oportunidades e perspectivas nos próximos anos.

A Região Africana continua a fazer face a inúmeras emergências de saúde, entre as quais as doenças com potencial epidémico que têm um efeito devastador no tecido económico e social dos países. A maioria destes eventos são de origem infecciosa, e a cólera, a meningite e as febres hemorrágicas virais contam-se entre as mais frequentes. A cólera foi responsável por 1231 óbitos nos últimos 12 meses.

No que concerne à iniciativa mundial de erradicação da poliomielite, a Região Africana registou uma redução de 66% dos casos de poliomielite por vírus selvagem. Por exemplo, Angola está livre da poliomielite há mais de 16 meses e a República Democrática do Congo há pelo menos 10 meses. A transmissão do poliovírus no Chade reduziu-se consideravelmente nos últimos 12 meses.

Infelizmente, na Nigéria, o único país endémico na nossa Região, o número de casos de polio duplicou, razão pela qual a OMS e outros parceiros internacionais neste domínio reforçaram o seu apoio ao governo da Nigéria. Temos esperança que a Nigéria conseguirá ultrapassar esta situação.

A luta contra as epidemias de meningite, às quais cerca de 500 milhões de pessoas estiveram expostas anualmente nos países do Sael, conta hoje com uma arma poderosa que é a nova vacina conjugada contra a meningite meningócica do tipo A. Lançámos na semana passada, na República do Benin a campanha de vacinação que comemorou 100 milhões de pessoas vacinadas em África.

Sobre o Objectivo de Desenvolvimento do Milénio número 4: redução da mortalidade das crianças com idade inferior a cinco anos: A taxa de mortalidade das crianças com idade inferior a 5 anos continua a diminuir na Região Africana, de 153 por 1000 nados-vivos no ano 2000, para 107 por 1000 em 2011. Contudo, cerca de 40% dos óbitos em crianças com menos de cinco anos ocorrem no primeiro mês de vida, o que reflecte uma fraca atenção aos cuidados neonatais. 

Sobre o Objectivo de Desenvolvimento do Milénio número 5: redução de ¾ do rácio da Mortalidade Materna. A mortalidade materna diminuiu, em média, de 720 óbitos por 100 000 nados-vivos em 2000 para 480 óbitos por 100 000 em 2010. A Região Africana registou progressos na melhoria da saúde materna, mas não é suficiente para a consecução do ODM5.

No que toca a outros problemas de saúde pública, as doenças crónicas, incluindo as perturbações mentais e os traumatismos, representam cerca de 60% do peso actual das doenças a nível mundial. Em todo o mundo, cerca de 37 milhões de mortes são atribuíveis a doenças não transmissíveis (DNT). A incidência das doenças crónicas, está a aumentar rapidamente, e afecta também as populações pobres e carenciadas. A maioria das doenças crónicas está associada a factores de risco como o tabagismo, a alimentação pouco saudável, a inactividade física e ao abuso do álcool. Escusado será dizer que precisamos de reforçar a promoção da saúde, para reduzir o nível de exposição dos indivíduos e das comunidades a estes factores de risco.

Os grandes desafios de saúde pública estão associados às determinantes da saúde que mudam de forma imprevisível e se distribuem de forma desigual. Lembro-me e cito uma passagem do relatório de 2008 da Comissão sobre as Determinantes Sociais da Saúde  que diz que “a falta de cuidados de saúde não é a razão principal do elevado peso das doenças no mundo. Por exemplo, as doenças de transmissão hídrica (como a cólera), não são provocadas pela falta de antibióticos, mas pelo consumo humano de água imprópria. As doenças do coração não são causadas pela falta de serviços especializados em doenças coronárias, mas pelo tipo de vida que as pessoas levam”. Fim de citação.

As reformas dos sistemas de saúde devem portanto efectuar-se num quadro mais amplo que melhore também as condições e a qualidade de vida das pessoas. Portanto, devemos estar preparados para lidar com uma agenda de saúde pública ampla e cada vez mais complexa, com novos problemas interligados a surgirem ao longo do tempo. 

O financiamento da saúde continua a ser uma preocupação, uma vez que a melhoria do estado de saúde das populações dele depende em grande medida. 

O compromisso dos Chefes de Estado e de Governo em Abuja, de consagrar pelo menos 15% do orçamento nacional ao sector da saúde foi alcancado por cinco países. Vinte e quatro países africanos conseguiram alcançar a cifra de 44 dólares de despesa de saúde por habitante por ano recomendada pelo Grupo de Trabalho Internacional sobre Financiamento Inovador. A média da despesa total em saúde por habitante aumentou de 35 para 82 dólares durante os últimos 10 anos. A conferência dos Ministros da Saúde e dos Ministros das Finanças de África realizada pela primeira vez este ano em Túnis, reforçou o compromisso da aliança estratégica entre os ministérios da saúde e das finanças e apelou à gestão mais eficiente dos recursos, ao aumento do investimento no sector da saúde e, incluindo, mecanismos inovadores de financiamento e enfatizou a necessidade de maior transparência e  prestação de contas. 

Assistimos actualmente a uma tendência para a abordagem muito hospitalar dos serviços de saúde, à comercialização dos cuidados de saúde e à fragmentação dos sistemas nacionais de saúde. É necessário que os países reforcem a implementação das suas políticas baseadas nos cuidados de saúde primários e velem pela promoção das determinantes da saúde. A execução eficaz dos cuidados de saúde primários contribuirá à realização da cobertura universal dos cuidados de saúde. Contudo, os aspectos do financiamento devem ser tratados com atenção de acordo com o contexto económico e social de cada país. 

A OMS tem insistido na elaboração de contas nacionais de saúde, na gestão mais eficiente dos recursos disponíveis para a saúde; e na adopção de regimes de pré-pagamento (taxas ou seguros de saúde) que ajudariam certamente a prevenir os custos de saúde catastróficos e depauperantes. 

A crise dos recursos humanos para a saúde perdura e é sem dúvida um dos factores que fragilizam os sistemas de saúde. A Região Africana comporta cerca de 26% do peso mundial das doenças e tem apenas 3% dos profissionais de saúde (2% do total de 10 milhões de médicos e 4% do total de 20 milhões de enfermeiros/parteiras). Trinta e seis países da Região fazem face a uma crise aguda de recursos humanos de saúde. Em média, a Região Africana precisa de um aumento de 140% do seu efectivo para cobrir o défice. 

Saudamos os países que decidiram aumentar a capacidade de formação de médicos e outros profissionais de saúde e alertamos para a necessidade de garantirem a qualidade da formação de acordo com os padrões internacionalmente estabelecidos.   

Em relação às tecnologias de saúde queria referir que o acesso às vacinas de rotina melhorou consideravelmente, havendo ainda necessidade de acelerar a introdução de novas vacinas. O acesso das populações a medicamentos de qualidade continua problemático. Alguns países iniciaram ou reforçaram a sua capacidade de produção local de medicamentos; a União Africana concebeu recentemente um plano que visa o reforço da indústria farmacêutica em África. Todas estas iniciativas carecem de regulamentação farmacêutica mais actuante e que nos permita também prevenir a circulação e consumo de medicamentos falsos. É nesta perspectiva que sugerimos a criação da Agência Africana do Medicamento.

  • Sua Excelência Senhor Vice-Presidente da República,
  • Excelências Senhoras e Senhores Ministros da Saúde,
  • Distintos Convidados,

Se puder resumir o que disse em cinco pontos, diria que:

  1. O estado de saúde das populações africanas melhorou nos últimos anos e a tendência é para continuar.
  2. O crescimento económico em África oferece novas oportunidades de reformas bem-sucedidas, mas é preciso que os sistemas de saúde delas usufruam.
  3. As reformas devem incidir sobre as componentes dos sistemas de saúde com menor desempenho; por exemplo, financiamento, recursos humanos, sistemas de informação sanitária e vigilância epidemiológica, das tecnologias de saúde, à investigação e inovação.
  4. No processo de decisão é preciso ter em conta as opiniões e as expectativas das comunidades e organizações de base comunitária em matéria de saúde.
  5. O diálogo intersectorial para a saúde deve ser reforçado através da liderança dos ministros da saúde, com vista à promoção das determinantes sociais da saúde e à criação de condições objectivas para a redução das desigualdades em saúde e realização da cobertura universal dos cuidados de saúde em África.
  • Excelência Sr Vice Presidente,
  • Excelências,
  • Distintos participantes e convidados,

Gostaria de agradecer muito em particular ao Senhor Ministro da Saúde e ao Senhor Secretário de Estado da Saúde de Angola e à equipa interministerial do governo que trabalhou de forma excelente para criar as condições de realização deste evento. Reitero à S. Exa Sr. Engº Manuel Domingos Vicente, Vice-Presidente, pela sua presença que muito nos honra neste acto.

O Secretariado da OMS está preparado para dar a sua contribuição técnica e científica para o sucesso da 62.ª sessão do Comité Regional.

Grato pela vossa atenção.